quarta-feira, 19 de janeiro de 2005

 

A Adopção


Falar-se de casamento entre homossexuais (com esse ou com outro nome) traz necessariamente à baila um tema inequivocamente relacionado, mas muito mais polémico: a adopção de crianças por casais homossexuais.
Aqui as opiniões dividem-se e extremam-se, tanto quanto são inevitavelmente influenciadas mais pelas paixões que lhe são subjacentes do que pela razão a que deveriam obedecer. De ambos os lados da “barricada”, diga-se de passagem.

Quando se fala na eventualidade de uma criança, digamos, de 8 anos, ser adoptada por um casal homossexual imediatamente vemos nos olhos do nosso interlocutor uma fervilhante imaginação a funcionar: um lar composto de dois homens, que dormem juntos na mesma cama, que se beijam, que trocam carícias e onde até um deles, diz o estereótipo, “desempenha o papel” que normalmente caberia à mulher. Tudo isto à frente da pobre criança.
Aqui aparecem as primeiras opiniões contrárias: claro que a criança tem de ser resguardada de tudo isto. Desta “anormalidade”, dirão uns; desta “aberração”, dirão ainda outros.

Claro que, em sentido contrário, existem argumentos igualmente válidos: que considerar a homossexualidade uma “anormalidade” ou até mesmo uma “aberração” é um preconceito estúpido e medieval, que não faz qualquer sentido.
E isso é um facto!
E pergunta-se ainda: mas “resguardar” a criança de quê? E porquê? Qual é o mal de uma criança ser educada num lar onde há harmonia, amor, conforto material e psicológico? Não será tudo isso o que se deve desejar na educação de uma criança, ainda que provenha de duas pessoas do mesmo sexo?

A isso ouve-se esta resposta: mas é que a criança tem de ser educada com valores e referências de masculino e feminino, de homem e mulher, tem de estruturar a sua personalidade de acordo com modelos parentais normais, o que certamente não lhe é proporcionado por uma educação entre homossexuais.
E ainda por cima a criança era muito bem capaz de ser gozada e apontada a dedo na escola.

É então que ouço retorquir: quer isso dizer que deveremos pura e simplesmente retirar as crianças às mães solteiras e divorciadas? Ou às que ficam viúvas?
É que nesses lares, então, as crianças também não têm referências de masculino e feminino. E ainda por cima não vêem trocas de carícias como uma coisa normal, pois nem sequer a elas assistem.
Como estruturarão eles a sua personalidade? Que modelos parentais e referências de normalidade vão ter?
E quanto ao gozo na escola, quer isso dizer, também, que devemos retirar as crianças aos pais se um deles esteve preso? É que isso também pode ser motivo de chacota na escola!

Ah, responde-se: mas essas referências podem ser obtidas noutros locais, na escola, nos avós, etc. E mais: essa referência, mais do que física, é principalmente psicológica.
Pois! Do mesmo modo que se o casal fosse homossexual. Ou agora isso já não vale?...

Mas, ouço insistir: se a criança crescer entre homossexuais, não estará ela sujeita a vir a ser homossexual também?
E surgem então os argumentos “finais”: e qual é o problema de a criança vir a ser homossexual? Voltamos ao preconceito, é?
E onde é que está provado que a criança corra um “risco estatístico” de vir a ser homossexual?
E, ainda assim, será preferível que a criança continue numa instituição, onde tantas vezes não passa de mais «um número»?
E então não se discutem os lares onde o pai sova sistematicamente a mãe à frente dos filhos? E às vezes até deles abusam sexualmente? Isso é melhor que viverem numa casa de homossexuais?
E mais: se é pela educação que a criança recebe em casa que pode vir a ser homossexual, deverá então concluir-se que o maior perigo disso vir a acontecer deverá provir dos casais heterossexuais! Pois não são os homossexuais na sua quase totalidade criados numa família “normal”, pelo seu pai e pela sua mãe?...
Não será esta lógica irrefutável???

E a polémica não tem fim.
E é então que começam a extremar-se os argumentos.

E já que aqui estamos, permitam-me os mais ferozes opositores da adopção de uma criança por casais homossexuais, também um argumento extremo:
Imaginemos a tal criança de 8 anos. Agora imaginemos que a criança é tailandesa.
E imaginemos que os pais, pela miséria mais extrema que se pode imaginar, a venderam por um punhado de arroz a um qualquer chulo de sucesso internacional, que a instalou numa casa de prostituição. E então a criança de 8 anos, a troco de meia dúzia de patacos que nem sequer vê, é várias vezes ao dia violada e seviciada por abjectos nababos europeus ou americanos, que se babam pelos cantos da boca quando vêem crianças desta idade, e que à vezes não vão à Tailândia senão para isso.
Imaginemos agora um casal de homossexuais, digamos, portugueses: um engenheiro, outro médico e que vivem em Lisboa. Querem adoptar a criança e levá-la daquele pardieiro onde está enterrada, daquela vida de miséria onde viverá não mais do que meia dúzia de anos, até morrer de inanição ou de SIDA.

Quem pode ser contra esta adopção?
Quem defenderá que a criança está melhor na Tailândia que numa casa homossexual em Lisboa?

Mas isto é um caso extremo, dirão.
Pois é! É extremo, mas é absolutamente vulgar!!!
E sabem uma coisa? Não é preciso sequer ir à Tailândia para assistir a casos semelhantes!

Pergunto então: e que tal se nos deixássemos de extremismos?
E que tal se nos deixássemos de preconceitos?
Defender liminar e dogmaticamente que se proíba sempre a adopção por casais homossexuais, não será um extremismo ou um preconceito, igualmente tão perigosos como defender que se autorize sempre a adopção por casais heterossexuais?
Porque, antes de mais, é preciso que fique bem ciente de que aqui não se trata de defender os direitos dos homossexuais:
- O que está aqui em causa são os direitos das crianças!!!

Então, porque não dar sempre ao problema da adopção de crianças uma solução que passe pela análise de cada caso, um a um?
Que tal se antes de olharmos para o casal que a quer adoptar, olharmos primeiro para a criança?
Porque não pensar simplesmente que a adopção de uma criança deve ser aceite se for previsível que "aquela criança em concreto", vai viver melhor, que vai ser alimentada, educada, estimada, amada, independentemente de o ser por uma família heterossexual ou homossexual?

Não será essa a «normalidade» que queremos, e que defendemos para a tal criança de 8 anos?



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