terça-feira, 5 de abril de 2005

 

O Fundamentalismo


Fundamentalismo:
«s. m.,
aceitação e defesa de um conjunto de princípios diferentes dos nossos».



Ao que parece, é esta a mais actualizada definição do conceito de «fundamentalismo» com que desde logo é mimoseado quem não se rende aos encantos do Papa João Paulo II na hora da sua morte.

Onde estará, afinal, o fundamentalismo?
Quem foi este homem, cuja morte milhares de pessoas choram?

Não falo do chefe religioso ou do líder espiritual, que me é completamente indiferente.
Refiro-me ao homem e ao Chefe de Estado, e aos reflexos e consequências das políticas que defendeu, e principalmente aos modelos que fez prevalecer, não só nas sociedades de maioria católica, como é o caso da portuguesa, mas até em todo o planeta.

Que fez este homem para merecer a homenagem dos chefes de estado e líderes religiosos do mundo inteiro?
Que papel preponderante teve no mundo?
Que legado deixou Karol Wojtila à humanidade?

Não quero agora falar das críticas a que já me referi no «post» anterior, e que não quero repetir.
Refiro-me agora unicamente aos aspectos positivos apontados ao seu pontificado.
Depois de muita pesquisa, serão talvez estes os principais elogios feitos a João Paulo II:

Em primeiro lugar, atribuiu-se-lhe um grande fervor ecuménico: João Paulo II reuniu com os líderes das principais religiões mundiais, e foi o primeiro Papa a rezar numa sinagoga e numa mesquita.
É certo. Mas quais as consequências concretas disso?
Nenhumas, de facto!
Muito pelo contrário, a aproximação a algumas religiões cuidadosamente escolhidas só terá contribuído para aprofundar o fosso com as religiões ou crenças proscritas, ainda que cristãs, e até com os movimentos mais polémicos dentro da própria Igreja Católica.

Em segundo lugar, atribui-se a João Paulo II um papel preponderante na definição das políticas mundiais, por ocasião das delicadas mudanças contemporâneas do soçobrar do regime soviético e da queda do muro de Berlim.
Recordo unicamente que naquela época João Paulo II fez uma visita de Estado à Polónia quando Lech Walesa chefiava o sindicato «Solidariedade».
Mas recordo também que, para além do significado da visita em si, nenhuma palavra de sentido político foi proferida, nem nenhum gesto foi praticado que pudesse significar apoio aos movimentos democráticos.
Tudo o que pudesse afrontar o regime de Jaruselski foi cuidadosamente evitado.
Assim, e bem vistas as coisas, que mais fez em concreto João Paulo II para além de apoiar efusivamente Margareth Tatcher ou Ronald Reagan, e o seu lado da Guerra Fria?
Para além de um discurso de um anticomunismo primário e de princípio (que, como já disse anteriormente, muitos confundem com humanismo), que atitude, que acto, que gesto, foram feitos que tenham contribuído para uma mudança real e concreto no mundo?
Rigorosamente nada!
Admito que poderá perguntar-se: que mais poderia João Paulo II ter feito?
Exactamente: não poderia ter feito mais nada. E foi exactamente isso que ele fez...

Em terceiro lugar, elogia-se João Paulo II por ter pedido perdão pelos erros da Igreja no passado.
Ora bolas: eu queria era tê-lo visto a pedir perdão pelos erros da Igreja no presente!
Talvez isso pudesse ter evitado novos erros.
Ou impedido a reiteração da prática de erros antigos.

Finalmente, e em quarto lugar, chamou-se a João Paulo II o «Papa Peregrino»: terá visitado 130 países em todos os continentes.
Ora, e uma vez mais, quais as consequências desta peregrinação?
De facto, para além dos óbvios dividendos pastorais, uma vez mais nenhumas!

Karol Wojtila, bem sei, durante todo o seu pontificado condenou as guerras, os conflitos armados e o terrorismo, e denunciou as injustiças sociais e a imoralidade das políticas materialistas neo-liberais.
E, principalmente, aprofundou a doutrina social da Igreja (com o que de positivo e de negativo isso significa).

Mas onde podia ter contribuído para o progresso da Humanidade, Karol Wojtila falhou!

Em 1978 João Paulo II recebeu do conclave dos cardeais uma Igreja dividida e polémica, completamente estagnada e indiferente às pessoas.
Depois de quase 27 anos de pontificado, João Paulo II deixa uma Igreja bem pior, pois sempre entendeu valorizar a ortodoxia religiosa em detrimento das reclamações de humanismo que o homem contemporâneo justamente reclama e exige.

Karol Wojtila lega aos seus fiéis uma Igreja que não está em paz, polémica e pejada de escândalos pedófilos que incrivelmente são deixados impunes.
Uma Igreja que, afinal, vive de costas para a Humanidade, e é cada vez mais imune às mudanças e à evolução do Homem do século XXI.
Por isso, é minha opinião que João Paulo II será recordado pela História como um Papa teocraticamente absolutista, profundamente misógino e homofóbico, convictamente retrógrado e teimosamente conservador e reaccionário.

Não foi, de facto, um bom Papa.



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